sexta-feira, 6 de março de 2015

Olhar com bondade, viver com justiça!

Autor: Boaz Rios
Geralmente conhecemos muito pouco e, às vezes, quase nada, sobre pessoas, coisas, situações, enfim, sobre tudo na vida. O julgamento sobre coisas ou situações é fortemente influenciado pela imensa quantidade de informações que atualmente temos acesso, como também, pelo caráter volátil dessas informações que se desatualizam rapidamente, tornando as decisões, ainda mais, complexas. Já, em se tratando de pessoas... como é difícil ter um juízo perfeito!
Fazer juízo de valor ou fazer escolhas quanto a pessoas, coisas ou situações, são atitudes do nosso cotidiano. Não temos como negá-las ou, sequer, fugir delas. É preciso desenvolver habilidades para melhor discernir, analisar e se posicionar ante os dilemas da vida.
É errôneo e enganoso o pensamento que nos afasta dos julgamentos, como se tudo se resolvesse naturalmente, sem que, ao menos, tivéssemos que tomar decisões à luz da música popular: "Deixa a vida me levar...". Outros, equivocadamente, poderiam até usar as palavras de Jesus: "Não julgueis e não sereis julgados" (Mateus 7:1). No entanto, o propósito do Mestre era afastar o juízo hipócrita, desarrazoado e sem equidade, pois, em outro momento, o mesmo Jesus afirma: "Julgai segundo a reta justiça" (João 7:24). Outros textos bíblicos alertam para a necessidade e o cuidado no julgar: … julgaste bem. (Lc 7:43); ... por que não julgais também por vós mesmos o que é justo? (Lc 12:57); ...julgai vós mesmos o que digo … (1Co 10:15); Mas o que é espiritual discerne bem tudo … (1Co 2:15).
Convém nos determos um pouco na busca do caminho que nos conduz ao julgamento equilibrado e justo. Neste sentido, é preciso ter cuidados com generalizações, como: "Não há ninguém em que se possa confiar"; "Todos são iguais e cometem os mesmos erros"; "As coisas são assim mesmo...". Generalizar é tentar fugir das escolhas, ignorando-as. Este estilo de vida, à deriva, proveniente da não decisão, revela duas características: conformação e impotência.
A conformação pode representar uma aceitável resignação ante ao irremediável, mas, por outro lado, pode resultar de uma adaptação forçada pelas circunstâncias. Conformando-se, evita-se estabelecer distinções e predileções, que poderia levar a confrontos internos e externos. Logo, generalizar, suaviza as relações e adia a necessidade de escolha.
Generalizar, por outro lado, representa impotência quando universaliza determinadas características pela simples razão de não querer ou supor que não possa confrontá-las. É evidente que ativamos o senso crítico a cada nova situação apresentada, porém, é muito mais confortável jogar na vala comum ou tratar com banalidade o novo que se revela, do que posicionar-se quanto a ele.
Ao afastar-se das generalizações, é preciso cautela quanto ao perigo da supremacia das minorias. Deus é tão minucioso em sua criação que deu a cada ser no universo características peculiares, compondo harmonicamente a beleza da vida, como diz as escrituras: "E Deus viu tudo que havia feito, e tudo havia ficado muito bom" (Gênesis 1:31). Isto quer dizer que as pequenas particularidades, os detalhes e peculiaridades são importantes, todavia compõem um todo. Pelo princípio da harmonia universal, sobrepor peculiaridades, supervalorizar coisas e situações, ou tentar ver o mundo por somente uma cor, mesmo que seja com cinquenta tons, desequilibra a harmonia edênica, e distorce a beleza da vida.
Diante da necessidade de julgar, é importante atentar para o caminho traçado por Jesus Cristo: "Os olhos são a candeia do corpo. Se os seus olhos forem bons, todo o seu corpo será cheio de luz" (Mateus 6:22). Observa-se que a bondade determina a luminosidade do corpo, afastando o julgamento equivocado, desatencioso ou sombrio. Isto aponta para a necessidade de buscar princípios divinos a fim de valorar as nossas decisões e podermos olhar com bondade e viver com justiça, como veremos a seguir.
Como primeiro princípio destacamos a Supremacia e a satisfação de Deus em cada juízo. Sem dúvida, Deus é o julgador supremo: "É Deus quem preside na assembleia divina; no meio dos deuses, ele é o juiz" (Salmos 82:1). Por mais que persistam atitudes despreocupadas ou inconsequentes, no fundo, sabemos que em algum momento nossas escolhas serão expostas diante de nós como um déjà vu, em plenitude de razão e consciência diante de Deus, que é expressão da verdade suprema.
Muitas vezes julgamos mal, porque o fazemos para nós mesmos. Quando aprendemos a escolher a partir de Deus, mudam-se os critérios da seleção e passamos a desejar agradá-lo. A satisfação de Deus será a nossa alegria na certeza das melhores escolhas: "Porque nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si. Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. De sorte que, ou vivamos ou morramos, somos do Senhor" ( Romanos 14:7-8).
Como segundo princípio destacamos que existe nas decisões um caráter personalíssimo, como se lê: "De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus" (Romanos 14:12-13). As escolhas são próprias de cada um, não devendo ser transferidas a ninguém, e mesmo que sejam, as consequências não recairão sobre outra pessoa, mas sempre serão colhidas pelo transmissor. 
Frisamos, como terceiro princípio, que a paz e o cuidado com o próximo são balizadores nas decisões. Buscar a verdade a qualquer custo, como se resultasse de uma aventura épica, pode causar muita dor e sofrimento a si mesmo e a outros. Por outro lado, a revelação maior é fruto do amor de Deus que se manifestou ao mundo (João 3:16), de forma que todos que a recebem tenham a vida, e participem da verdade inclusiva. Por isso, na trajetória da vida com justiça não atropelamos, não abandonamos, não sufocamos, mas buscamos o crescimento coletivo, como aconselha o apóstolo Paulo "Sigamos, pois, as coisas que servem para a paz e para a edificação de uns para com os outros" (Romanos 14:19).
É preciso destacar que a vida encontra sua plenitude em Deus, seu criador, que não compactua com a maldade, como nas palavras do salmista: "Como é feliz aquele que não segue o conselho dos ímpios, não imita a conduta dos pecadores, nem se assenta na roda dos zombadores! Ao contrário, sua satisfação está na lei do Senhor, e nessa lei medita dia e noite" (Salmos 1:1-2). Neste sentido, a limitação da impiedade se coloca como quarto princípio divino para  olhar com bondade e viver com justiça.
Outro princípio encontra-se na necessária proteção aos humildes. Atualmente, o princípio da hipossuficiência é garantido em lei em alguns casos, e jurisdicionalmente reconhecido nos tribunais. Por isso, aqui se coloca como o quinto princípio de modo a olhar com bondade e viver com justiça, a exemplo do que alerta o salmista: "Até quando vocês vão absolver os culpados e favorecer os ímpios? Garantam justiça para os fracos e para os órfãos; mantenham os direitos dos necessitados e dos oprimidos. Livrem os fracos e os pobres; libertem-nos das mãos dos ímpios" (Salmos 82:1-3). 
Por fim, Paulo aponta o sexto e último princípio aqui examinado, ao orientar que sejamos revestidos de amor para aperfeiçoar os vínculos, nomeando a paz de Cristo como o juiz nos corações (Colossenses 3:14-15). Isto quer dizer que ao estabelecer as relações  no amor oferecido por Jesus, haverá paz nas decisões, escolhas e julgamentos, conforme aponta Paulo: "E também faço esta oração: que o vosso amor aumente mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção, para aprovardes as coisas excelentes e serdes sinceros e inculpáveis para o Dia de Cristo, cheios do fruto de justiça, o qual é mediante Jesus Cristo, para a glória e louvor de Deus" (Filipenses 1:9-11).
Concluindo, enfatizamos que julgar é necessário, mesmo implicando em muitos dilemas, desafios e desgastes. Os princípios divinos aqui apontados não são os únicos e, portanto,  outros critérios bíblicos podem ajudar neste difícil processo, afinal, como orienta o sábio Salomão: "O que começa o pleito parece justo, até que vem o outro e o examina" (Provérbios 18:17).

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