Por Boaz Rios
Nos versos da
bela canção de Vinícius de Moraes e Tom Jobim a felicidade está relacionada a
momentos de extremo prazer e beleza, porém, logo esvanece. Seja a pluma que
voa, a gota que cai, o carnaval que acaba ou a frustração de não ter os beijos
da mulher amada, a poesia enfatiza a tristeza que não acaba, conflitando com a
alegria passageira.
Em alguns
versos de Cecília Meireles, a poesia da tristeza se revela num desejo
inalcançável que domina toda a vida impedindo a possibilidade de qualquer outra
alegria: “Sou triste porque a minha alma não quer mais nada, do que tem...
Porque a minha alma não pode ter nada mais... Sou triste, sou triste, sou
triste porque sonhei coisas inalcançáveis, que se não devem sonhar!...”.
Essas são
algumas impressões que se tem da felicidade, pois na vida ela é desejada,
perseguida e apreciada, no entanto, rapidamente se apresenta passageira, sutil
e, às vezes, ilusória e decepcionante. A felicidade, também, pode ser
alcançada através das realizações, ou seja, em razão do sucesso obtido nos
empreendimentos pessoais, nos relacionamentos, ou em outras áreas da vida. Melhor
ainda, quando se fica feliz no sabor da surpresa, quando se chega a um prazer
inesperado, fortuito, para o qual, em nada se colabora e somente dele desfruta.
Percebe-se
ser tão fácil atrelar a felicidade a espaços, momentos ou circunstâncias, sendo
que a sua fugacidade empresta lampejos de alegria à vida cheia de tristezas e
decepções. Por outro lado, aumenta-se a distancia entre os conceitos
"ser feliz" e "estar feliz". Quando se pensa em momentos,
circunstâncias, ou demais fatores que ensejam a felicidade, então, o conceito é
o de "estar feliz". No entanto, "ser feliz" é uma
predisposição, um impulso imanente capaz de persistir, inclusive, diante das
condições adversas. Seria isso possível? Por mais que a felicidade pareça circunstancial
para alguns, por certo, encontramos muitos que são felizes apesar das
circunstâncias.
Alguns
filósofos já discorreram a respeito da alegria que antecede condições externas
ao próprio indivíduo, como em Espinosa, no qual a alegria é potência de agir, ou
em Soren Kierkegaard, quando afirma que a alegria chega a ser inexplicável, como
vemos:
Há uma alegria indescritível, que emana através de
nós tão inexplicavelmente como quando irrompeu do Apóstolo sem aparente motivo:
“Alegrai-vos, e novamente vos digo: alegrai-vos”. Não uma alegria sobre isso ou
aquilo, mas um grito sincero de toda alma “com a língua e boca do fundo do meu coração”. [Søren Kierkegaard]
Quando se
despedia dos seus discípulos, antevendo a hora de sua partida, Jesus Cristo
assim comentou: "Assim acontece com
vocês: agora é hora de tristeza para vocês, mas eu os verei outra vez, e vocês
se alegrarão, e ninguém lhes tirará essa alegria" (João 16:22). Nesta frase, o Mestre reconhece a
tristeza circunstancial, porém afirma e garante aos seus discípulos uma alegria
inesgotável e incondicional.
Ao crer em
Deus como razão de tudo, por conseguinte, toda a existência, inclusive a
humana, a Ele se submete e dEle depende. Deste modo, quando cremos em Deus
desta forma, entendemos os nossos sentimentos à medida que a sua revelação nos
alcance e nos ajude nesta autocompreensão, como explica João Calvino: "o
homem jamais chega a um conhecimento puro de si mesmo sem que, antes, contemple
a face de Deus, e, dessa visão, desça para a inspeção de si mesmo." (CALVINO,
J. A Instituição da Religião Cristã, I, L. I e II. São Paulo:
UNESP, 2008, p.38).
Então, a
tristeza está sujeita a condições, circunstâncias e momentos, porém a alegria é
impulso, é potência para agir, é força para viver, como exclamou Neemias: “Este
dia é consagrado ao nosso Senhor. Não se entristeçam, porque a alegria do
Senhor os fortalecerá” (Neemias 8:10).
É preciso
entender a poesia da tristeza no limite das suas condições promovedoras. Logo,
a tristeza não tem fim, por exemplo, somente enquanto persiste a fútil decepção
de esperar pela alegria do carnaval ou quando aspira coisas inalcançáveis.
Contudo, a tristeza logo se dissipa quando se volta para Deus, permitindo por
Ele ser renovado, inspirado e conduzido à alegria que não tem fim.